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Humilhação para líderes ocidentais? China, Rússia e Índia buscam aumentar influência com vacinas

 Índia, China e Rússia têm aproveitado a oportunidade para usar as suas vacinas como uma ferramenta diplomática. —  Foto/Reprodução.

Humilhação para líderes ocidentais? China, Rússia e Índia buscam aumentar influência com vacinas
Publicado no Conexão Notícia em 14.fev.2021.  

Mundo | Enquanto as vacinas contra o novo coronavírus são um produto escasso e em alta demanda no mundo todo, os países capazes de produzir as suas próprias doses têm a chance de usá-las não só para imunizar a sua população, mas também para aumentar sua influência no cenário internacional.

Rússia, Índia e China (ou três quintos dos Brics) têm aproveitado a oportunidade para usar as suas vacinas como uma ferramenta diplomática, com exportações ou doações de doses a países em desenvolvimento, potencialmente movimentando alianças geopolíticas.

O presidente da França, Emmanuel Macron, disse que os "sucessos diplomáticos" da China ao distribuir vacinas para outros países poderiam ser vistos como "um pouco humilhante para nós, [líderes ocidentais]". Falando ao think tank Atlantic Council no começo do mês, Macron ainda cobrou transparência dos fabricantes chineses de vacinas contra a Covid-19.

A China tem usado a diplomacia das vacinas em um esforço para reparar o estrago na sua imagem após o coronavírus ter se espalhado a partir do seu território - e por não ter sido transparente no início do surto. Como a epidemia está aparentemente controlada no território chinês, o país tem a possibilidade de concentrar mais esforços na distribuição de vacinas para o mundo.

A primeira doação de vacinas da China foi para o Paquistão, que recebeu no começo do mês 1,2 milhão de doses do imunizante da Sinopharm. O plano de Pequim é enviar doses gratuitamente para mais de uma dúzia de países da África e da Ásica.


Da corrida espacial à corrida pelas vacinas
A Rússia foi o primeiro país a aprovar uma vacina contra o coronavírus, ainda em agosto de 2020. A Sputnik V, batizada em homenagem ao satélite soviético que foi o primeiro a orbitar a Terra, ainda não havia passado pela etapa final dos testes clínicos quando o presidente Vladimir Putin anunciou que o seu uso estava autorizado no país. Até então, nenhum dado da pesquisa havia sido publicado e por isso a vacina foi recebida com desconfiança pelo mundo. Mas a publicação dos resultados finais dos testes com a Sputnik V no Lancet no início de fevereiro, que mostrou que o imunizante tem eficácia de 91,6%, ajudou a dissipar as preocupações da comunidade científica.

A pressa em ser o primeiro a ter a vacina de que o mundo inteiro precisa demonstra a estratégia de Putin de tentar reconquistar para a Rússia o status de grande potência global. Para isso, o país busca expandir suas zonas de influência e contrabalançar o poder dos Estados Unidos. E a América Latina é peça importante nesse jogo diplomático.

No continente, a Argentina foi o primeiro país a dar o sinal verde para a vacina russa e abriu caminho para que ela chegasse a vizinhos da região. O governo de Alberto Fernández enviou missões a Moscou em outubro e dezembro de 2020 para inspecionar os dados dos testes com a Sputnik V. A delegação argentina traduziu para o espanhol centenas de páginas de informações sobre a vacina russa, um passo necessário para a aprovação, e compartilhou o documento com outros países, incluindo México, Bolívia, Peru, México, Uruguai e Chile, segundo noticiou o El País.

A Rússia já tinha se posicionado anteriormente na região, como aliada da Venezuela. Enquanto grande parte do mundo pressionava o regime de Nicolás Maduro, Moscou era um de seus principais apoiadores (ao lado da China), uma ligação estratégica que permite à Rússia marcar presença no "quintal" nos Estados Unidos.

Como consequência desses laços, a Venezuela fez parte dos ensaios clínicos da Sputnik V e em dezembro assinou um contrato para a compra de 10 milhões de doses. Na terça-feira (9), o ditador Nicolás Maduro anunciou que a Venezuela receberá na próxima semana as primeiras 100 mil doses da Sputnik V.

A União Europeia até o momento não aprovou uma vacina da Rússia ou da China. Mas em meio à frustração dos países membros com a lentidão da resposta do bloco à vacinação, um país decidiu autorizar o uso de vacinas antes mesmo da aprovação dos reguladores da UE: a Hungria permitiu, nesta semana, o uso da Sputnik V e da vacina da chinesa Sinopharm em seu território, tornando-se o primeiro país a romper com a estratégia coletiva de vacinação coordenada pela UE. Uma regra permite aos países autorizar medicamentos em emergências, mas, nesse caso, a responsabilidade sobre o uso fica com os governos.

Outros países da União Europeia também demonstraram interesse em comprar a Sputnik V. Mas a Comissão Europeia já indicou que o bloco não pretende comprar nem distribuir o imunizante russo. A agência regulatória EMA pode, no entanto, conceder a autorização para a vacina, que poderia então ser comercializada nos países do bloco.

Para o primeiro-ministro da Ucrânia, Denys Shmyhal, a Rússia está usando a sua vacina para conquistar influência política nos territórios em conflito na Ucrânia e em países do leste europeu. Ele disse ao site Politico que e União Europeia deveria ajudar países parceiros que estão com dificuldades em garantir doses.

A Federação Russa está tentando impor sua própria vacina produzida domesticamente especialmente como uma ferramenta para influenciar algumas dessas regiões, especificamente aquelas que não são controladas pelo governo ucraniano. Isso não é apenas aqui, mas também em muitos países do leste europeu, afirmou o primeiro-ministro ucraniano.

Para ele, para combater essa "propaganda política", seria importante mandar a mensagem de que esses países estão tendo apoio da União Europeia em relação à vacinação.

A farmácia do mundo
A Índia, maior produtor de medicamentos genéricos do planeta, já era conhecida como a "farmácia do mundo". O país produz atualmente 62% da demanda global de vacinas. Durante a pandemia, a Índia exportou medicamentos, insumos médicos, equipamentos de saúde, kits de testes, entre outros, para dezenas de países.

O governo indiano apoiou medidas para a suspensão dos direitos de propriedade intelectual sobre as vacinas contra o coronavírus durante a pandemia - o que facilitaria a produção de versões genéricas dos novos imunizantes.

O país asiático também desenvolveu localmente suas vacinas contra o coronavírus em empresas como a Bharat Biotech e a Zydus. Já o Serum Institute colabora com a AstraZeneca/ Universidade de Oxford na produção da vacina contra a Covid-19.

Além de lançar a maior campanha do mundo de vacinação contra o novo coronavírus, que tem a meta ambiciosa de imunizar a sua população de 1,3 bilhão de pessoas, a Índia tem fornecido gratuitamente milhões de doses a países da região do Oceano Índico.

O primeiro-ministro Narendra Modi vê na diplomacia das vacinas uma forma de reatar laços com nações vizinhas. Por exemplo, a Índia pretende reparar a relação com Bangladesh, que se desgastou quando Nova Délhi implementou uma controversa lei de cidadania, e pelos investimentos de US$ 40 bilhões da China no país vizinho, relatou o Foreign Policy.

A diplomacia das vacinas também é uma chance para a Índia se acertar com o Nepal, após os dois países terem se envolvido em disputas territoriais, e também de fazer um contrapeso à influência da China, que tem feito investimentos em países como Maldivas e Ilhas Maurício.

No início do mês, o governo brasileiro anunciou a negociação para a compra de 20 milhões de doses da Covaxin, vacina indiana produzida pela Bharat Biotech.

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